Quando eu tinha por volta dos onze anos eu adorava o início do ano escolar. Escolher os materiais... As lapiseiras e canetas.
Tinha ainda aquela clássica redação sobre como foram as férias. Enquanto meus colegas ficavam assombrados sem saber o que escrever, eu via as palavras correrem fácil pelo papel. Eu escrevia sobre minhas férias e outras histórias inventadas para meus amigos que não sabiam ou tinham vergonha de escrever as deles. E assim o lado de escritor ia tomando espaço. Mas com o despertar da vida adulta eu precisava aprender a chamar meus textos de profissão. Acalmar as preocupações dos meus pais com algo que “Desse dinheiro.” Como eles diziam.
Tentei blogs e antologias até conseguir publicar o meu primeiro livro. Nesse meio tempo tinha a formação, os cursos que fiz no Senai e algumas tentativas fracassadas de emprego. Meu pai não aguentava mais abrir a porta do quarto e me ver na frente do computador.
Mesmo que eu estivesse ali enviando currículos ou escrevendo alguns dos textos que tempos depois iriam compor um dos meus livros, nada adiantava. Para ele eu era apenas um jovem vagabundo matando o tempo na internet.
Engraçado que alguns dos textos escritos naquela época se tornaram o livro preferido dele. O que ele guardava para contar vantagem do filho escritor.
Depois de muitos currículos enviados eu consegui uma entrevista, uma vaga de auxiliar de manutenção. Eu não queria aquele emprego. O que queria mesmo era tranquilizar meu velho até o lance da escrita dar certo. Não queria ser um desocupado aos seus olhos. Logo ele que sempre se desdobrou tanto pela nossa família. Decidi que se eu arrumasse aquele emprego ele ficaria feliz até eu provar que essa história de escritor não era um sonho adolescente.
Contei pra ele sobre a entrevista. E sabendo que a empresa ficava a uns dez quilômetros lá de casa, eu iria de bicicleta. Ele logo se ofereceu pra me levar, para que eu não chegasse suado. Engraxou meu sapato e me emprestou uma camisa pra que eu estivesse apresentável. Sobrava pano, já que eu era bem magro na época, mas ele me olhou sorridente. Isso que importava! Assim que chegamos ele me desejou boa sorte e disse que iria entrar só pra tomar um copo d´água.
Quando entramos na empresa eu me apresentei e fui encaminhado para a sala do dono. Meu pai tomou sua água, porém antes de sair aproveitou a porta aberta e foi até a sala de entrevistas se despedir e reforçar o desejo de boa sorte.
Ter levado meu pai foi algo que chamou a atenção do entrevistador que pediu que ele se sentasse ao meu lado. Ele disse nunca ter visto um pai fazer uma entrevista ao lado de seu filho. Mesmo que o convite tenha sido dele.
Por fim meu pai falou bem de mim o quanto pode, mentiu o quanto deu para levantar a minha bola e saí de lá ser a contratação. Acho que pedir emprego com o pai do lado não pega bem.
Por um tempo pensava que esta história não teve um final feliz, mas vejo que não é bem assim. Se eu tivesse conseguido aquele emprego, talvez hoje não fosse escritor e não tivesse enchido meu pai de orgulho.
E quem diria que ter feito uma entrevista de emprego tendo meu pai como companhia não renderia um emprego, mas renderia uma crônica?
Realmente, eu sempre fui escritor. Acho que eu e meu pai fomos os últimos a perceber.
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