Eu sempre tive uma vida muito bem organizada. Tudo posto nos mínimos detalhes.
Quase um cronograma em Excel.
Acordo às cinco, me espreguiço às cinco e quinze, brinco com o gato, treino, leio um pouco, tomo banho, faço o café e vou trabalhar.
Ao chegar do trabalho, brinco um pouco mais com o gato (sim, ele é carente!) leio mais um pouco, escrevo alguma ideia para a crônica do jornal, faço algo pra comer e me deito no sofá.
Daí sim o ócio vira rei e define o que fazer.
Muitas vezes esse fazer se resume em vários “nadas”. Mas com a certeza do dever cumprido, da rotina finalizada.
Todos os itens ticados.
É metódico, até demais admito. Mas sempre funcionou.
Em uma segunda qualquer troquei o sofá pelo bar.
Gosto de brincar com o acaso, numa dessas vai que...
E não é que foi?
Conheci alguém, começamos conversar, assim despretensiosamente, como quem compartilha segredos no sofá em um domingo chuvoso.
Em duas três horas sei lá ao certo a gente parecia ser íntimos, conversamos sobre tudo. O que muitos escritores chamam de amenidades e que eu prefiro chamar de papo de boteco.
Ela me falou que ama os filmes do Adam Sandler e que casou com dezenove anos. Que gosta de pagode e já assistiu todas as animações da Disney.
De mim falei pouco, só ouvindo.
Ela me deu uma carona pra casa, ficamos sentados na calçada conversando por mais algum tempo. A boca ficou seca e entramos pra tomar água.
A água virou uma taça de vinho, que virou uma garrafa que virou uma noite pra nunca mais se esquecer.
Me lembro que a cama girava feito roda gigante, ou era só o efeito etílico de nossa noite.
Que diferença faz?!
Acordei no dia seguinte com a cabeça latejando, haja café pra curar a ressaca.
Fiquei o dia inteiro pescando na frente do computador, dando cabeçadas no teclado. Minha rotina se foi em meio a sono e saudade da minha cama.
Saudade dela!
A cada pescada eu lembrava daquele sorriso, daquela pinta próxima aos lábios.
Foi a primeira vez na minha vida que saudade e ressaca viraram sinônimos.
Hoje eu queria ver ela de novo, mas não sei se o sono vai deixar, melhor deixar pra quarta. Acho que entre noites com ela preciso de noites de sono.
Só pra equilibrar as coisas.
Ela mandou mensagem, disse que adorou a noite.
Conexões assim são raras, sono a gente encontra em qualquer noite, em qualquer cama.
Prioridade!
Não sei o que fazer, sempre fui muito indeciso, por isso uma rotina tão rígida.
Aí veio ela e mudou tudo, em uma noite me fez ver que tem coisas que não se pode deixar pra depois.
Uma noite... E ela fez tudo isso comigo, imagina no fim da semana...
Queria saber, mas acho que na verdade a gente nunca sabe.
Tem vezes que sente, outras não.
É sempre um risco.
Eu até queria ir dormir cedo, mas ela mandou uma carinha fofinha e uma figurinha que era impossível dizer não.
Não vai ter jeito, a gente vai se ver hoje de novo.
Até queria trocar o vinho pelo suco de uva. Mas ela sugeriu pedir japa. Uma coisa leva à outra…
A gente até que tenta manter a rotina, mas é que a vida...
Bem, essa aí não está nem aí pro nosso planejamento.
Comentarios